
Uma análise
mais distanciada da emoção que tomou conta da nação naquele agosto de 1942,
quando mais de 600 brasileiros morreram nos afundamentos de cinco navios na
costa nordestina, mostra que, sim, o Brasil foi vítima de atentados covardes e
traiçoeiros. Entretanto, levando-se em conta a postura do governo brasileiro,
tais ataques nunca poderiam ser classificados – como foram – de inesperados.
Desde os
primeiros anos do conflito mundial, deflagrado em 1939, o Brasil mantinha-se
oficialmente como um país neutro. Mais próximo ideologicamente dos regimes
totalitários alemão e italiano do que da democracia norte-americana, o ditador
brasileiro era visto na política internacional como um possível parceiro do
Eixo caso resolvesse tomar partido no conflito. Apelidada de “Polaca”, a
Constituição outorgada por Vargas em 30 de novembro de 1937, inclusive,
inspirava-se nas leis fascistas do polonês Józef Pilsudski, morto em 1935, e
incluía artigos claramente copiados do regime italiano de Benito Mussolini, o
que aproximava ainda mais o Brasil das ditaduras europeias, ao menos do ponto
de vista ideológico. Outro fato que demonstrou a proximidade com o Eixo foi a
deportação, a pedido de Berlim, da judia Olga Benário, militante comunista de
origem alemã, companheira de Luís Carlos Prestes.
Por outro
lado, a presença de Oswaldo Aranha, ex-embaixador do País em Washington e,
desde 1938, ministro do Exterior, garantia aos Estados Unidos um sólido
alicerce dentro do governo brasileiro. Além disso, durante os primeiros anos do
conflito, as vantagens comerciais oferecidas pelo livre comércio, o
financiamento da Companhia Siderúrgica Nacional e o aparelhamento militar
brasileiro com recursos americanos – apenas para citar algumas razões –
aproximaram decisivamente o Brasil dos Estados Unidos.
Até Walt
Disney fez sua parte para promover a aliança entre os dois países. Hospedado no
Copacabana Palace Hotel, no Rio, no começo dos anos 1940, o produtor e cineasta
americano criou o personagem Zé Carioca, um retrato estereotipado do
brasileiro, visto pelos irmãos do norte como um sujeito preguiçoso, mas, ao
mesmo tempo, divertido. Em 1941,
a criação do Ministério da Aeronáutica e da Força Aérea
Brasileira, também com participação decisiva americana, selou de vez um
possível pacto em caso de entrada dos dois países na guerra.
No fim
daquele mesmo ano, em dezembro, o ataque japonês a Pearl Harbor precipitou o
ingresso dos Estados Unidos no conflito. Um mês depois, em janeiro de 1942, o
Brasil rompeu relações diplomáticas com o Eixo. O gesto, que enfureceu Adolf
Hitler, foi o marco para a escalada de agressões e intimidações que se
seguiram, tornando irreversível a opção de Getúlio Vargas pelo lado
norte-americano.
No início de
1942, os alemães realizavam uma intensa campanha submarina no Atlântico, a
chamada operação Rufar dos Tambores (Paukenschlag), visando a impedir a
chegada de suprimentos à indústria bélica americana. Após o rompimento de
relações diplomáticas entre os dois países, os navios brasileiros – muitos
deles carregados de borracha, usada em esteiras de tanques e em correias de
motores – passaram a ser vistos como alvos extremamente aprazíveis para os
submarinos nazistas.
Em 15 de
fevereiro, o cargueiro Buarque foi o primeiro a ser atacado, próximo à costa
americana. Depois disso, seguiu-se uma série de torpedeamentos a embarcações
nacionais. Até julho, 15 navios brasileiros haviam sido atingidos, todos fora
da costa do País, totalizando 136 mortos.
Àquela
altura, os diplomatas alemães já não se esforçavam para justificar supostos
enganos nos ataques a embarcações brasileiras. Nas entrelinhas, a mensagem era
clara: não havia engano algum – e o Brasil estava pagando o preço por sua
escolha.
Para que
Getúlio se desse por conta de que não havia como voltar atrás em sua opção pela
trincheira aliada, faltava apenas um acinte à soberania nacional, um ataque
deliberado a uma cidade brasileira ou a embarcações nacionais na costa do País.
Entre 15 e 17 de agosto, Hitler deu a Vargas o empurrão que faltava para que
este descesse do muro de sua hesitação.
Após o
torpedeamento de cinco navios na costa nordestina, em um intervalo de menos de
72 horas, o povo tomou as ruas e exigiu a entrada do Brasil na guerra. Por todo
o território nacional, estudantes, sindicalistas, políticos e empresários
manifestaram sua revolta contra os atentados.
Em várias
cidades, empreendimentos comerciais pertencentes a imigrantes do Eixo foram
depredados. Placas com nomes italianos foram arrancadas e bandeiras nazistas,
queimadas em praça pública. No Rio de Janeiro, estudantes passaram a perseguir
os colegas de origem italiana, alemã e japonesa. Sem saída, Getúlio Vargas
declarou estado de beligerância ao Eixo em 22 de agosto.
Curiosamente, repetia-se o roteiro de 1917, quando, depois de ataques de submarinos alemães a vapores brasileiros, o País decidira entrar na Primeira Guerra Mundial. Na ocasião, forçado por uma imensa revolta popular, o presidente Venceslau Brás optou pela trincheira aliada. Vinte e cinco anos depois, chegava a hora de Getúlio Vargas tomar uma atitude. Com o orgulho novamente ferido por um U-Boot, o Brasil abandonou definitivamente a neutralidade e, em 31 de agosto, declarou guerra à Alemanha e à Itália.
Curiosamente, repetia-se o roteiro de 1917, quando, depois de ataques de submarinos alemães a vapores brasileiros, o País decidira entrar na Primeira Guerra Mundial. Na ocasião, forçado por uma imensa revolta popular, o presidente Venceslau Brás optou pela trincheira aliada. Vinte e cinco anos depois, chegava a hora de Getúlio Vargas tomar uma atitude. Com o orgulho novamente ferido por um U-Boot, o Brasil abandonou definitivamente a neutralidade e, em 31 de agosto, declarou guerra à Alemanha e à Itália.