sábado, 20 de abril de 2013

A patrulha contra a quinta-coluna


O temor de algum incidente envolvendo as casadas é a principal razão para que o comandante José Ricardo não aprove e até condene, sempre que possível, os contatos da sua tripulação e também dos jovens militares com os passageiros civis – principalmente as passageiras. A carranca do manda-chuva da embarcação rendeu, nos cochichos entre os soldados, o boato de que ele seria um “quinta-coluna”, como são conhecidos os colaboradores e espiões do Eixo infiltrados no País.
O termo, que designa os possíveis inimigos camuflados nas entranhas brasileiras, surgiu no fim da década anterior, na Espanha. O líder fascista espanhol Francisco Franco preparava uma marcha com quatro colunas de soldados sobre Madri, enquanto uma “quinta coluna”, clandestina, esperava-o para apoiá-lo na capital espanhola. Agora, na Segunda Guerra, a expressão ganhou força em alusão aos contingentes que apoiam as ações nazistas em todos os continentes, atuando como sabotadores, espiões, propagandistas ou simples simpatizantes dos ideais do Terceiro Reich.
No Brasil, qualquer um que pareça suspeito de algum desses predicados já é chamado, muitas vezes sem saber disso, de quinta-coluna. É o caso de José Ricardo, olhado de esguelha por alguns soldados. O comandante, porém, é apenas um homem sério e zeloso do bem-estar em seu navio – embora, por vezes, seu aspecto rude contribua para o contrário, como acontece com os praças do Grupo de Artilharia de Dorso.

(TRECHO DO LIVRO "U-507")

domingo, 14 de abril de 2013

Palestra na ESPM-Sul

Na última quinta-feira (11), o autor do livro "U-507" palestrou na Semana do Jornalista da ESPM-Sul, em Porto Alegre. Na palestra, Monteiro falou aos alunos da Faculdade de Jornalismo sobre os desafios encontrados na produção de uma reportagem histórica. Confira a reportagem no site da ESPM-Sul.

terça-feira, 9 de abril de 2013

Os 28 do Baependy

"Depois de remar durante a noite inteira ajudados pelo vento – alguns sobreviventes revezavam-se tirando a água da baleeira com um balde –, os 28 náufragos do Baependy explodem de alegria ao enxergarem a costa. Apesar da penumbra da passagem da noite para o dia, já é possível visualizar no horizonte a estreita faixa de areia branca.
No entanto, ainda são necessárias muitas remadas até que se alcance a terra firme. Perto da praia, a baleeira chacoalha perigosamente diante da forte rebentação. Mais alguns metros e, enfim, os sobreviventes estão a salvo. O capitão Lauro Moutinho dos Reis, que chegou a pensar que morreria no momento em que fora puxado para o mar com o Baependy, está radiante. Depois de tudo o que passou, seu coração pula de alegria, como se quisesse saltar peito afora. O grupo chega a uma praia deserta, a cerca de 30 quilômetros da barra do rio Real."

(TRECHO DO LIVRO "U-507")

sábado, 6 de abril de 2013

Façanhas assinadas

"Como em suas casas, os comandantes dos U-boots gostam de personalizar a torre de suas embarcações. Os desenhos são como carimbos, espécies de assinaturas para as suas façanhas bélicas – na aflição de salvar a própria pele, um sobrevivente de um navio torpedeado certamente irá lembrar-se muito mais de uma figura colorida pintada na torre do que de um número qualquer estampado no casco do submarino.
No começo de 1942, assim que os testes de mar e os treinamentos foram concluídos, Schacht ordenou a pintura de um porco sorridente, com o nariz e a boca cor-de-rosa, em ambos os lados da torre de comando do U-507. Mais tarde, quando começou a tornar-se famoso por suas façanhas, mudou a caricatura para um simpático cachorro, pintado em branco, sobre um fundo cinza escuro.
No U-506, o segundo submarino a chegar ao Golfo do México, o comandante Erich Wüdermann preferiu a figura de um homem usando uma cartola e carregando dois baldes de água, conhecido como Hummel Hummel. Para os estrangeiros, pode até parecer um enigma, mas, para os alemães, é uma referência bem familiar. A figura representa um dos símbolos da cidade de Hamburgo, inspirado em Johann Wilhelm Bentz, um popular que viveu na cidade por volta de 1800. Desajeitado e mal-humorado, sempre que saía para buscar água, o sujeito era alvo de gozações das crianças locais, que o provocavam com um ingênuo xingamento da época. Indignado, o cidadão mostrava as nádegas para as crianças e respondia com muito menos ingenuidade. Com o passar das décadas, tal figura transformou-se em uma celebridade hamburguesa, inspirando desenhos e esculturas espalhadas por todos os cantos da cidade. Agora, na guerra, sua fama ganha o mundo graças à pintura no casco do U-506."

terça-feira, 2 de abril de 2013

"Manobras livres" no Brasil

"Apesar de jovem, Harro Schacht pode ser considerado um comandante experiente. Até chegar à sua terceira patrulha pelo Atlântico Sul, já atacou 10 embarcações inimigas, provocando o afundamento de nove delas. Por isso, a ordem que recebeu há alguns dias foi encarada com naturalidade. Em 7 de agosto, o comandante das operações no Atlântico, Karl Dönitz, enviou-lhe por rádio uma mensagem autorizando-o a usar “manobras livres” ao longo da costa brasileira. Em outras palavras, diante da escalada de hostilidades entre Brasil e Alemanha desde o rompimento das relações diplomáticas, não há mais qualquer restrição a ataques a navios brasileiros, tanto em alto-mar quanto em regiões próximas à costa.
Pouco mais de dois anos antes, em 15 de maio de 1940, Dönitz realizou uma espécie de teste no Atlântico, com apenas um submarino. O U-37, primeiro submersível a deixar a costa da Noruega após a invasão do país, ordenada por Hitler em 1º de março, na Operação Weserübung, foi enviado ao Atlântico para medir a vulnerabilidade da esquadra britânica. Usando torpedos e armas de convés, em apenas duas semanas conseguiu afundar 11 navios mercantes inimigos. O teste foi um sucesso. Além de minar a confiança inglesa, a ação levantou o moral dos alemães. Radiante, Dönitz mandou preparar duas flotilhas de submarinos para uma operação muito maior e mais bem planejada.
O fato, somado ao afundamento do couraçado alemão Bismarck, um gigante de 42 mil toneladas, no ano anterior, no Estreito da Dinamarca, contribuiu para que os nazistas decidissem mudar de estratégia, passando a apostar nos U-boots como sua principal arma contra os comboios aliados. Agora, a Alemanha mantém um verdadeiro arsenal submarino – e o Brasil também está na sua mira."

(TRECHO DO LIVRO "U-507")

quarta-feira, 13 de março de 2013

Autor dá palestra em Rondônia


Na última sexta-feira (8), o autor do livro "U-507", Marcelo Monteiro, palestrou em Porto Velho (RO), na aula inaugural do curso de pós-graduação em Jornalismo da Faculdade Santo André. Durante cerca de duas horas, Monteiro falou sobre os desafios e as dificuldades encontradas no processo de produção da obra, lançada nacionalmente em agosto de 2012. O evento recebeu um público de cerca de 70 pessoas, entre estudantes de comunicação, jornalistas, historiadores e autoridades. A atividade se encerrou com um pronunciamento do diretor Departamento de Comunicação do Governo de Rondônia (Decom), o jornalista Júlio Olivar. Veja mais fotos do evento na fan page do U-507 no Facebook.

sábado, 9 de março de 2013

Mentiras cifradas

"Nos bastidores diplomáticos, os alemães prosseguem em seu trabalho silencioso para tentar incriminar o Brasil e, de alguma forma, amenizar o ataque maciço do U-507. No sábado (29), Berlim envia uma mensagem cifrada e repleta de inverdades às embaixadas alemãs em Buenos Aires e Santiago, informando que, “conforme noticiado pela imprensa brasileira”, o embaixador do Brasil em Montevidéu, João Batista Luzardo, admitira publicamente a parcela de culpa do País nos atentados. “Os navios partiram do Rio, em comboio, para Pernambuco, a fim de transportar tropas. Nas imediações do litoral, perto de Sergipe, foi de repente avistado um submarino, a curta distância do navio-transporte Baependy. O navio-transporte ameaçou em seguida o submarino, que respondeu com torpedo. O torpedo acertou no centro do navio. Durante a luta com os demais navios, conforme as declarações do embaixador brasileiro, foi aniquilado também o submarino do Eixo.” Anos mais tarde, Luzardo desmentiria todas as declarações que lhe foram atribuídas pelos nazistas."

(TRECHO DO LIVRO "U-507")

quinta-feira, 7 de março de 2013

Erro político

"Em seu livro de memórias, publicado em 1968, o almirante Karl Dönitz, que em 1943 assumiu o comando da Marinha alemã, substituindo Erich Raeder, admitiu ter sido um erro político a ação levada a cabo pelo U-507 na costa brasileira. “Posto que isso em nada alterasse a nossa amizade para com o Brasil, que já havia tomado parte em atos hostis contra nós, foi evidentemente um erro ter impelido o Brasil a uma declaração de guerra oficial: politicamente, nós deveríamos ter sido advertidos no sentido de evitar tal procedimento; os comandantes de flotilha, entretanto, como membros das forças armadas, não tiveram opção senão obedecer às ordens que lhes tenham sido dadas, pois não lhes competia pesar e medir suas consequências políticas.”
Após a morte de Hitler, em 30 de abril de 1945, Dönitz assumiu a presidência – posto abolido nos anos iniciais do nazismo e restabelecido somente no iminente fim do regime – por um período de 23 dias. Assim, o ex-comandante-em-chefe dos U-boots e, mais tarde, da própria Kriegsmarine, entrou para a história como o último líder do Terceiro Reich."

(TRECHO DO LIVRO U-507)

segunda-feira, 4 de março de 2013

Perseguição implacável

Alcoa Puritan, afundado pelo U-507 em 6 de maio de 1942
Algumas vezes, a lealdade de Schacht aos ideais nazistas chega ao limite em que a crueldade e a ironia tornam-se espécies de armas contra os inimigos. Em 6 de maio, dia seguinte aos ataques a Munger T.Ball e Joseph M. Cudahy, foi a vez do Alcoa Puritan cruzar o caminho do U-507. A embarcação, da Alcoa Steamship Co., de Nova York, fora construída em San Francisco, no ano anterior, e pesava 6,7 mil toneladas, com 121 metros de comprimento, 18 metros de largura e 10 metros de profundidade.
Ao meio-dia, a cerca de 80 quilômetros a sudeste do Mississipi, tripulantes avisaram o capitão Yangvar Krantz sobre a aproximação de um torpedo pela popa do navio. O comandante mandou o navio manobrar, a todo vapor, ficando completamente de costas para o projétil, deixando assim uma área menor como alvo para o U-boat. A manobra funcionou, e o torpedo passou ao largo da embarcação.
No U-507, Schacht não se deu por vencido e começou uma perseguição. Mais rápido, o submarino não teve dificuldades para alcançar o Alcoa Puritan, carregado com 10 mil toneladas de bauxita. Depois de cerca de 25 minutos de rajadas de metralhadoras do convés do submarino, um tiro certeiro de grosso calibre na cauda fez o timoneiro perder o controle do navio americano. Sem saída, Krantz ordenou o abandono da embarcação.
Irritado, o comandante do U-507 não tomou conhecimento e prosseguiu com o bombardeio. Um barco salva-vidas foi destroçado antes mesmo que os náufragos pudessem alcançá-lo. Restou aos tripulantes do Alcoa Puritan, entre eles oito sobreviventes de um navio-tanque atacado dias antes pelo submarino italiano Pietro Calvi, agarrarem-se a um bote salva-vidas e a duas pequenas balsas. Por milagre, apenas dois dos 41 tripulantes e oito passageiros ficaram feridos por estilhaços.
Mal os salva-vidas tinham sido arriados, o U-507 disparou um torpedo a bombordo do navio, que explodiu e afundou em cerca de oito minutos. Pouco depois, como de praxe em ataques desse tipo, o próprio Schacht emergiu para averiguar o sucesso de operação.
Em seguida, manobrou o submarino em direção aos náufragos, perguntou onde estava o comandante e dirigiu-se ao bote onde estava Krantz:
– Você pode agradecer ao senhor (Franklin Delano) Roosevelt por isso – disse Schacht, com um inglês impecável e uma ponta de ironia, antes de desejar que os americanos chegassem à praia em segurança. – Desculpem, eu tive que afundar o seu navio, mas esta é a guerra.

(TRECHO DO LIVRO "U-507")

domingo, 3 de março de 2013

O segundo torpedo

Além de não saberem como soltar as baleeiras, tripulantes e passageiros têm uma dificuldade a mais para lançar os barcos salva-vidas ao mar: recém-pintadas, as cordas que prendem as embarcações mantêm os nós praticamente colados.
A cerca de 300 metros, com a imagem do navio recortada no periscópio pelas luzes da capital sergipana, Harro Schacht comemora o tiro certeiro. O torpedo fez um estrago na parte posterior do casco da embarcação, registra em seu diário. Para garantir que o mercante irá afundar, o capitão dispara também o projétil do tubo 3.
Menos de um minuto depois do primeiro ataque, o novo tiro acerta em cheio os tanques de óleo combustível, causando uma grande explosão. As últimas luzes internas do Baependy se apagam. As labaredas se estendem por toda parte, atingindo quase o topo do mastro principal. O fogo e a queima do óleo deixam no ar uma fumaça sufocante e nauseabunda. Em pânico, os radiotelegrafistas sequer conseguem fazer funcionar a estação de transmissão. Não é possível nem pedir socorro.

(TRECHO DO LIVRO "U-507)

sexta-feira, 1 de março de 2013

"Inominável atentado"

Às 18 horas, o Departamento de Imprensa e Propaganda emite uma nota oficial, pela qual o governo manifesta-se oficialmente a respeito dos torpedeamentos do Baependy, do Araraquara e do Aníbal Benévolo. O documento ainda não menciona os ataques ao Itagiba e ao Arará, ocorridos pela manhã. A nota oficial passa a ser reproduzida sistematicamente por todas as emissoras de rádio do País. O DIP classifica o episódio como um “inominável atentado”:

Pela primeira vez embarcações brasileiras, servindo o tráfego de nossas costas no transporte de passageiros e cargas de um estado para outro, sofreram o ataque dos submarinos do Eixo. Nesses três últimos dias, entre a Bahia e Sergipe, foram afundados os vapores Baependy e Aníbal Benévolo, do Lloyd Brasileiro, e Araraquara, do Lloyd Nacional S/A. O inominável atentado contra as indefesas unidades da Marinha Mercante de um país pacífico, cuja vida se desenrola à margem, distante do teatro de guerra, foi praticado com desconhecimento dos mais elementares princípios de direito e humanidade. O nosso país, dentro de sua tradição, não se atemoriza diante de tais brutalidades e o governo examina quais as medidas a tomar em face do ocorrido. Deve o povo manter-se calmo e confiante, na certeza de que não ficarão impunes os crimes praticados contra a vida e os bens dos brasileiros.

(TRECHO DO LIVRO "U-507")

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

Ataque de tubarão

Longe das baleeiras, três soldados tentam chegar ao Arará. Dálvaro José de Oliveira e Carlos Salomão Bacarat nadam próximos e conversam, tentando animar-se. Mais atrás, sem que os dois possam vê-lo, Pedro Paulo Figueiredo Moreira – que ganhara a boia do tenente Alípio – procura alcançá-los.
– Fica tranquilo, Dálvaro. Sou bom nadador. Qualquer coisa, eu te ajudo – diz Bacarat.
Dois minutos depois, o soldado dá um urro repentino e desaparece nas águas, a um metro de Dálvaro, que, mesmo sem enxergar o que havia debaixo d’água, presume: tubarão. No momento em que desapareceu, desesperado, Bacarat ainda agarrou-se ao colete salva-vidas de Dálvaro, levando metade dele para o fundo do mar. “Deus do céu! Tô perdido!”, pensa o soldado sobrevivente, com os olhos esbugalhados de pavor.

(TRECHO DO LIVRO "U-507")

terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

O avião Arará



Uma das aeronaves compradas com o dinheiro arrecadado pela Campanha Nacional de Aviação, o Arará – um Catalina (modelo PBY-5) – afundou o submarino alemão U-199, em 31 de julho de 1943.
O batismo oficial com o nome do navio torpedeado na costa baiana, porém, só aconteceu em 28 de agosto, quase um mês depois do feito heróico. Em cerimônia no Aeroporto Santos Dumont, no Rio, o avião ganhou uma inscrição especial em sua cauda: “Doado à FAB pelo povo carioca”.
Em 20 de setembro do mesmo ano, cerca de 30 mil pessoas acompanharam a entrega do Itagiba, na doca número 1 do cais do porto de Porto Alegre. No feriado estadual em comemoração à Revolução Farroupilha, diversas autoridades marcaram presença, como o ministro da Aeronáutica, Salgado Filho, e o empresário Assis Chateaubriand, dono dos Diários Associados. Entretanto, ninguém chamou tanto a atenção e foi tão ovacionado quanto José Ricardo Nunes, o ex-comandante do navio afundado na costa da Bahia, que agora emprestava seu nome ao novo avião de guerra da Força Aérea Brasileira.